Desde o final do dia 26 de abril de 2023, o Telegram, aplicativo de mensagens utilizado por cerca de 400 milhões de usuários ao redor do mundo, está suspenso no Brasil por ordem da Justiça Federal de Linhares, no Espírito Santo, a pedido da Polícia Federal.
Hoje (28 de abril), estima-se que 95% dos usuários estão sem acesso ao aplicativo, segundo dados da Polícia Federal, e não há previsão de quando voltará à normalidade. Entenda porque o aplicativo de mensagens foi bloqueado e como isso pode impactar o seu negócio.
Telegram volta a funcionar no Brasil
Conforme publicado por fontes oficiais, o Telegram voltou a funcionar na manhã desta terça-feira (02 de maio), mas alguns usuários já estavam com acesso à rede social há alguns dias. O Tribunal Regional Federal da 2.ª Região (TRF-2), aceitou os argumentos da empresa contra sua suspensão no país, mas manteve a multa diária de R$ 1 Milhão para cada dia que a empresa se recusar a entregar informações sobre os grupos extremistas investigados pela Polícia Federal.
A medida de suspensão foi revogada no último sábado (29 de abril), portanto, alguns usuários começaram a receber novamente suas mensagens no aplicativo, porém com certa instabilidade.
Segundo o magistrado Flávio Lucas, da 2ª Turma Especializada do TRF-2, a suspensão do aplicativo afeta a ampla comunicação de milhares de pessoas que não estão relacionadas a nenhuma investigação:
“A suspensão completa do aplicativo em todo o país não guarda razoabilidade, considerando a afetação ampla em todo território nacional da liberdade de comunicação de milhares de pessoas absolutamente estranhas aos fatos sob apuração.”
O magistrado ainda apontou que as leis de regulamentação das redes sociais no Brasil são insuficientes e é necessário estabelecer uma legislação mais clara e específica:
“É necessário estabelecer regras mais claras e específicas para evitar abusos e proteger tanto a sociedade como os usuários, de forma equilibrada, sopesando direitos individuais e coletivos, em uma ponderação substancial de interesses constitucionais.”
Meu acesso ao Telegram ainda não voltou, o que pode estar acontecendo?
Caso você ainda esteja com acesso limitado ao Telegram, isso pode significar que a sua operadora de celular ou o sistema operacional do seu aparelho ainda não retornou 100% com a disponibilidade do aplicativo.
A InfoMoney, portal de investimentos e negócios no Brasil, entrou em contato com as principais operadoras de telefonia do país (Oi, Claro, Vivo e Tim), o Conexis Brasil Digital (ex-SindiTeleBrasil, sindicato que representa as teles) e com as empresas responsáveis pelas lojas de aplicativos que foram ordenadas a desabilitar o aplicativo de suas lojas – Apple e Google.
Até o momento, apenas o Google retornou o contato do portal indicando que o aplicativo foi restabelecido em sua loja no mesmo dia em que a suspensão foi revogada (29 de abril), enquanto as operadoras de telefonia informaram que o pronunciamento oficial será realizado pelo Conexis.
Então, caso o seu aplicativo ainda não esteja funcionando perfeitamente, pode ser que nos próximos dias as operadoras de telefonia já estejam com o acesso totalmente desbloqueado, o que fará com que o aplicativo volte a funcionar normalmente.
Por que o Telegram estava fora do ar?
Há cinco meses (novembro de 2022), um ataque realizado por um adolescente de 16 anos a duas escolas em Aracruz, no Espírito Santo, deixou treze feridos e levou três professoras e uma aluna à morte.
Recentemente, os agentes que investigam esse e outros casos de atentados às escolas, encontraram mensagens de dois grupos extremistas no celular do assassino, enviadas por meio do Telegram.
Segundo a Polícia Federal, o aplicativo foi suspenso depois que a plataforma desobedeceu a decisão judicial de fornecer dados de todos os integrantes desses grupos encontrados no celular do adolescente.
Cronologia dos fatos que levaram ao bloqueio do Telegram no Brasil
No dia 19 de abril de 2023, a Polícia Federal entrou com uma intimação para que o Telegram entregasse os dados dos grupos citados anteriormente, com pena de suspensão do aplicativo no prazo de 24 horas.
A ordem, no entanto, foi encaminhada ao aplicativo no dia 20 de abril, quando começou a valer o prazo de 24 horas. O Telegram pediu informações adicionais à PF e, no dia seguinte, a empresa responsável pelo aplicativo enviou informações sobre o administrador do grupo em questão, informando que, quando recebeu a ordem, o grupo já havia sido excluído e, portanto, não poderia incluir mais informações acerca dos integrantes.
Ainda no dia 21, a empresa disse que já havia enviado informações sobre o grupo extremista à PF de São Paulo no dia 10 de abril e as repassou para os agentes do caso. No entanto, a Polícia Federal rebateu que o grupo em questão não havia sido excluído até as 17 horas do dia 20 de abril, e o Telegram recebeu a ordem às 13 horas.
Além disso, segundo a Legislação vigente no país, as empresas fornecedoras de serviços de comunicação devem manter registro das informações de acessos (endereços de IP de criação e de acessos), dos grupos e usuários investigados. Mesmo assim, o Telegram manteve o discurso de que não poderia acessar as informações após a exclusão do grupo.
Assim, no dia 25 de abril, o Telegram foi multado em R$ 1 milhão para cada dia que o aplicativo não colaborar totalmente com as investigações e, no dia 26 de abril, a Justiça ordenou que as operadoras de telefonia e lojas de aplicativos retirassem o aplicativo do ar.
Segundo a Diretoria de Inteligência da PF, as principais empresas de telefonia do país – Vivo, Claro, Tim e Oi – bem como o Google e a Apple, receberam o ofício sobre a suspensão ainda naquela tarde.
Por quanto tempo o Telegram ficará fora do ar?
Na manhã do dia 27 de abril, o aplicativo estava com instabilidade, mas ainda operava no país. No entanto, ao decorrer do dia, as empresas de telefonia foram restringindo o acesso gradualmente e, até a manhã do dia 28, o aplicativo ainda não foi reativado.
Além disso, as lojas de aplicativos mais utilizadas, App Store da Apple e Play Store do Google, já desativaram a opção de download do aplicativo:
Como é possível observar na imagem acima, enquanto a Play Store do Google não permite a instalação do aplicativo por meio de um botão não clicável, a página do aplicativo na App Store, da Apple, nem sequer carrega.
Até o momento, a única informação acerca de um possível retorno do aplicativo é a entrega dos dados solicitados pela PF, o que significa que não há previsão de que o Telegram volte a funcionar normalmente nos próximos dias.
O que o Telegram disse sobre a suspensão do aplicativo no Brasil?
Na última quinta-feira (27 de abril), o cofundador do aplicativo, Pavel Durov, comentou sobre a decisão da Justiça Brasileira em suspender o aplicativo e defendeu que o aplicativo não pode fornecer as informações solicitadas pela PF. Confira o que foi dito na íntegra:
“A missão do Telegram é preservar a privacidade e a liberdade de expressão em todo o mundo. Em casos em que as leis locais vão contra essa missão ou impõem requisitos tecnologicamente inviáveis, às vezes temos que sair desses mercados. No passado, países como China, Irã e Rússia baniram o Telegram devido à nossa postura principiada sobre questões de direitos humanos. Tais eventos, embora infelizes, ainda são preferíveis à traição de nossos usuários e às crenças em que fomos fundados. No Brasil, um tribunal solicitou dados que são tecnologicamente impossíveis de obter. Estamos apelando da decisão e aguardamos a resolução final. Independentemente do custo, defenderemos nossos usuários no Brasil e seu direito à comunicação privada.”
Em resumo, Pavel explica que o Telegram possui uma política de preservação e segurança dos dados que faz parte da missão do aplicativo de mensagens e, quando as leis locais vão contra essa política, a empresa pode optar por deixar aquele mercado, como já fez em países como a Rússia, China e Irã.
Segundo a Delegada do Serviço de Repressão a Crimes de Ódio da Polícia Federal, Larissa Brenda da Silva de Miranda, a atitude do Telegram em não colaborar com as investigações não colabora para um ambiente digital mais seguro no Brasil:
“É importante que as plataformas tenham consciência da função social que elas exercem na sociedade. É preciso se comunicar com responsabilidades, ciente que as suas atitudes podem vir a ter uma repercussão criminal se ultrapassar uma determinada fronteira.”
Além disso, o Ministério da Justiça afirma que mais de 700 grupos extremistas ativos no aplicativo foram desabilitados após influenciar ou estimular ataques violentos nas escolas. Segundo o Ministro da Justiça, Flávio Dino, foram emitidos pedidos de preservação das informações de pelo menos 100 desses grupos, a fim de colaborar com as investigações.
Como a LGPD se aplica a esse caso de suspensão do Telegram no Brasil?
Conforme o segundo artigo da Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD – Lei Nº 13.709), sancionada em 2018:
“A disciplina da proteção de dados pessoais tem como fundamentos: o respeito à privacidade; a autodeterminação informativa; a liberdade de expressão, de informação, de comunicação e de opinião; a inviolabilidade da intimidade, da honra e da imagem; o desenvolvimento econômico e tecnológico e a inovação; a livre iniciativa, a livre concorrência e a defesa do consumidor; e os direitos humanos, o livre desenvolvimento da personalidade, a dignidade e o exercício da cidadania pelas pessoas naturais.”
Ou seja, no Brasil, nenhuma empresa pode fornecer ou vazar informações pessoais de seus usuários, clientes, fornecedores, colaboradores e stakeholders no geral. No entanto, em 14 de abril, a Polícia Federal pediu à Justiça Federal de Linhares a quebra do sigilo dos dados em sistemas de informática e telemática dos usuários do canal e do chat.
No artigo 4º da LGPD, está previsto que “esta Lei não se aplica ao tratamento de dados pessoais: […] realizado para fins exclusivos de: segurança pública; defesa nacional; segurança do Estado; ou atividades de investigação e repressão de infrações penais; […]”
Segundo a legislação brasileira, a PF e outras entidades de Justiça ou do Governo podem entrar com pedidos de quebra de sigilo de dados em casos como o atual. Nessas situações, é estabelecida pela Justiça Federal uma multa em caso de descumprimento ou, até mesmo, a suspensão das operações da empresa no país.
Como a suspensão do Telegram afeta a minha empresa?
Certamente, se você e ou sua empresa não utilizam este canal de comunicação, é pouco provável que essa suspensão cause impactos muito negativos na sua estratégia de comunicação.
No entanto, o Telegram é uma plataforma muito popular no Brasil. A pesquisa Panorama Mobile Time realizada em 2022 pela Opinion Box, mostra que 65% da população brasileira faz uso do aplicativo de mensagens instantâneas.
A popularidade do aplicativo é fruto dos seus recursos, principalmente voltados para empresas e criadores de conteúdo, de criar grandes grupos de mensagens e canais de comunicação com os clientes.
Portanto, se a sua empresa utiliza o Telegram para o disparo de mensagens de broadcast, atualizações de novidades sobre o seu negócio ou mesmo para controlar pedidos e orçamentos, é preciso migrar para um sistema temporariamente.
O WhatsApp poderá substituir o Telegram durante a suspensão do aplicativo?
Nos últimos meses, o WhatsApp vem otimizando seus recursos para oferecer uma experiência semelhante à do Telegram, principalmente pensando na criação de grupos com diversos clientes e testando funcionalidades de “Canais” para concorrer com o aplicativo de mensagens do avião azul.
O WhatsApp é a rede social mais popular no país, e o canal de mensagens mais utilizado também. No entanto, os recursos para criação de um canal de comunicação entre empresa e cliente eram escassos, o que levava a maior parte dos empresários a optar pelo concorrente menos popular – o Telegram.
Desde 2022, o aplicativo de mensagens da Meta possui um recurso de Comunidades, que é projetado para fornecer funcionalidades adicionais para os bate-papos em grupo no aplicativo, incluindo uma variedade de novos recursos, como compartilhamento de arquivos pesados, reações de emoji, chamadas de áudio em grupo e muito mais.
Agora, desde o dia 6 de abril, o WhatsApp vem testando o modelo de “Canais”, lançado inicialmente no Instagram, também no aplicativo de mensagens instantâneas.
Esse formato é muito semelhante ao do Telegram e pode ser uma oportunidade para os profissionais e marcas que preferirem não utilizar o Telegram por um tempo – mesmo que ele volte a funcionar.